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Em decorrência do sistema de controle prévio dos atos de concentração econômica instituído pela nova lei de defesa da concorrência (), vigente desde maio de 2012, empresas que notifiquem as
suas operações ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) não podem "consumar" a operação até a decisão final do Cade. Havia muitas dúvidas, entretanto, a respeito do
que constituiria a "consumação" de uma operação e, assim, sobre quais atos as empresas poderiam ou não praticar antes de obter a aprovação do CADE. Visando diminuir a insegurança
gerada no mercado, o Cade divulgou no dia 20/5 o ("Guia"), no qual busca estabelecer parâmetros para se evitar a prática de "_gun jumping"_, termo importado de
jurisdições anglo-saxãs para definir as situações em que ocorre consumação (total ou mesmo parcial) da operação antes da decisão final da autoridade antitruste. O Guia é dividido em três
seções: (i) atividades que caracterizam _gun jumping_, (ii) procedimentos para diminuição dos riscos de _gun jumping_, e (iii) possíveis punições. De acordo com o Guia, as seguintes práticas
podem caracterizar _gun jumping_: (i) troca de informações concorrencialmente sensíveis; (ii) definição de cláusulas contratuais que impliquem uma integração prematura; e (iii) condução de
certas atividades que caracterizem a efetiva consumação de ao menos parte da operação. Troca de informações concorrencialmente sensíveis que devem ser evitadas entre as partes envolve a
troca de dados sobre custos; nível de capacidade e planos de expansão; estratégias de marketing; precificação de produtos (preços e descontos); principais clientes e descontos assegurados;
salários de funcionários; principais fornecedores e termos de contratos com eles celebrados; informações não públicas sobre marcas e patentes e pesquisa e desenvolvimento (P&D); planos
de aquisições futuras; estratégias competitivas, e outras informações que não seriam trocadas usualmente entre concorrentes. Ademais, algumas cláusulas contratuais também podem caracterizar
_gun jumping_, tais como cláusulas de anterioridade da data de vigência do contrato em relação à sua data de celebração, que implique alguma integração entre as partes; estabelecimento de
não-concorrência prévia; pagamento antecipado integral ou parcial de contraprestação pelo objeto da operação, não reembolsável (com exceção de pagamento de um sinal típico de transações
comerciais, depósito em conta bloqueada (_escrow_) ou cláusulas de _break-up fees_); cláusulas que permitam a ingerência direta de uma parte sobre aspectos estratégicos dos negócios da outra
e que não configure mera proteção do investimento; bem como quaisquer cláusulas que prevejam atividades que não possam ser revertidas em um momento posterior ou cuja reversão implique
dispêndio de uma quantidade significativa de recursos por parte dos agentes envolvidos ou da autoridade. Finalmente, e com relação a atividades conduzidas pelas partes antes e durante a
implementação do ato de concentração, podem vir a ser consideradas problemáticas as seguintes situações: transferência e/ou usufruto de ativos em geral (inclusive de valores mobiliários com
direito a voto); exercício de direito de voto ou de influência relevante sobre as atividades da contraparte; recebimento de lucros ou outros pagamentos vinculados ao desempenho da
contraparte; desenvolvimento de estratégicas conjuntas de vendas ou marketing de produtos que configurem unificação da gestão; integração de força de vendas entre as partes; licenciamento de
uso de propriedade intelectual exclusiva à contraparte; desenvolvimento conjunto de produtos; indicação de membros em órgão de deliberação; interrupção de investimentos, etc. A fim de que a
troca de informações entre as partes da operação possa ocorrer sem violação da lei concorrencial, o Guia recomenda (i) a adoção de um protocolo antitruste, ou seja, um procedimento
específico estabelecido em âmbito privado, entre as partes, a ser observado por comitês independentes para tratar tais informações, (ii) a formação de _clean team _e/ou comitê executivo, de
forma que (iii) a troca de informações ocorra apenas por intermédio do _clean team_, que deve ser o único ponto de contato entre as empresas, (iv) compromisso de confidencialidade pelos
membros do _clean team_ e do comitê executivo, (v) que os dados concorrencialmente sensíveis recebidos pelo _clean team_ somente sejam divulgados ao comitê executivo de forma agregada e/ou
histórica, com periodicidade recomendável de no mínimo 3 (três) meses de sua ocorrência, e (vi) monitoramento das discussões mantidas por membros do comitê executivo (_parlor room_), com o
propósito de tratar do futuro processo de integração entre as empresas envolvidas na operação, de forma a garantir que nenhuma informação concorrencialmente sensível seja objeto das
discussões. A importância da atenção ao tema se redobra em função das contingências que a prática de _gun jumping_ pode gerar. A Lei de Defesa da Concorrência estabelece que as penas podem
incluir (i) multa pecuniária que pode variar de R$ 60 mil a R$ 60 milhões, (ii) instauração de processo administrativo, e (iii) nulidade dos atos consumados antes de apreciados pelo CADE. O
Guia estabelece que a aplicação da pena pecuniária levará em conta a situação da operação (momento da notificação - ou ausência desta - em relação à consumação); a natureza da decisão do
CADE (reprovação, aprovação com restrições e aprovação sem restrições), bem como a existência de sobreposição horizontal ou integração vertical decorrente da operação, e o porte econômico do
infrator. Desde a entrada em vigor da lei 12.529/11, o CADE julgou cinco casos de _gun jumping_, impondo contribuições pecuniárias que variaram de R$ 60 mil a R$ 3 milhões. _______________
*CRISTIANNE SACCAB ZARZUR, ANA CAROLINA ZORICIC e LEDA BATISTA DA SILVA são, respectivamente, sócia e associadas da Área Contenciosa de PINHEIRO NETO ADVOGADOS.